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Se você é mortal, e eu acredito que é, sim você vai morrer e eu também. Ando pensando muito sobre a morte de uns tempos pra cá, e calma! Eu tô bem! Aliás, eu nunca estive tão de bem com a vida - apesar dos altos e baixos, 2021, foi um ano incrível.
Se você achou que esse seria um post negativamente mórbido está absurdamente enganado.
Sim, a morte virou um assunto não dito que constantemente nos ronda, afinal, nossa única certeza é que um dia não estaremos mais aqui e isso nos assombra o suficiente para não querer tocar no assunto, nunca! A verdade é que pessoas morrem todos os dias - justamente por isso é um assunto que sempre está em alta - em todos os cantos do mundo, e é um processo natural, o fim do nosso ciclo, uns vão mais cedo e outros mais tarde. Todos partem sem exceção.
Hoje, em terapia, expus um pouco da minha relação com a morte e decidi escrever para vocês como eu fiz as pazes com o meu fim.
(ATENÇÃO Spoilers de: "Kimetsu no Yaiba" e "No final os dois morrem.")
A Beleza da Mortalidade
O primeiro contato positivo, e marcante, que eu tive com a mortalidade foi com o Rengoku Kyojuro de Kimetsu no Yaiba, em 2020, quando "Mugen Train" não havia sido lançado nem no Japão, mas já tínhamos o arco (e o mangá completo) em mãos.
Contextualizando para quem não tem conhecimento da obra (conhecida também como Demon Slayer), conta a história de Tanjiro Kamado datada na era do imperador Taisho no Japão. A família de Tanjiro sofre uma tragédia que acaba matando sua mãe e irmãos, exceto por Nezuko que é transformada em demônio e Tanjiro que estava fora na noite do acontecimento.
Ele então parte em busca de se tornar um espadachim que é capaz de derrotar demônios e curar sua irmã, nesse caminho árduo conhecemos os pilares que são espadachins de alto escalão e os mais qualificados, mas assim como nós... Eles são mortais.
Rengoku é um desses pilares e ele me ensinou muito com poucas palavras.
"Envelhecer e morrer é a beleza da criatura transitória chamada ser humano" e de fato, é, a morte como eu disse é aonde finda o ciclo da nossa preciosa existência nesse plano (independente de você acreditar em vida após a morte), aonde a gente deixa a nossa materialidade e passa a pulsar mais forte nos corações daqueles que ainda não se foram.
E por isso que temos que dar muito valor pra vida que temos em "mãos". Então cuide de você, se olhe com mais carinho, permita-se viver as coisas das quais tem vontade. A gente tem mania de achar que somos pra sempre e não somos.
Eu lembro que essa fala do Rengoku me tocou tanto, fiquei reflexiva por dias, quando a gente entende que a vida é extraordinária passamos a ter uma perspectiva muito mais calorosa, damos mais valor aos momentos: bons e ruins, faz parte da nossa história, parte do que fomos e o que vamos deixar marcado nos outros.
E quem melhor pra me ensinar isso que Rengoku Kyojuro?
Luto saudável
"Ué, mas então você não fica triste quando alguém morre?"
Se você se perguntou se eu sou uma barata de sangue frio saiba que: eu odeio baratas e sou chorona.
A morte nos assombra pois é um "lugar" desconhecido e também pelo fato que nunca mais vamos ter acesso direto aquela pessoa, e é triste, dilacerante, não poder ver mais quem se ama tanto - principalmente nós brasileiros que temos tanto isso do toque.
E tem muitos outros fatores que nos deixa devastados como "do quê a pessoa morreu?", "era tão jovem!" e etc, mas eu nunca disse aqui que você não pode e nem deve sofrer.
Pelo contrário.
Chore, contemple histórias de entes queridos, deixe a saudade se alastrar, celebre a vida e o legado que eles deixaram. Faça ritos fúnebres que sua cultura ou coração acreditam - como continuar oferecendo flores, refeições, longas conversas ou sei lá.
Acredito que somos obrigados a "superar" e nunca mais se emocionar ao falar de falecidos, caso o contrário você "não superou ainda" ou até mesmo "sensível demais para tocar no assunto", mas eu me pergunto, como se supera uma saudade que não se pode matar? Como não se emocionar ao falar de alguém que foi tão especial pra gente?
Somos ensinados que o choro constrange e incomoda as pessoas, e de fato, não é todo mundo que lida bem como o verbo chorar. Chorar ainda é sinônimo de fraqueza.
Enxergo pelo contrário: você tem que ser muito forte para abrir seu coração e não ter medo de chorar, não ter medo de ser sincero com o que sente, não ter medo de ser tomado pelas suas emoções e dores. E é lindo ser corajoso assim.
Um exemplo de coragem para mim foi a de Rufus do livro "No final os dois morrem."
Se você nunca ouviu falar desse livro vou dar uma contextualizada, no universo de "No final os dois morrem" você recebe uma ligação da "Central da Morte" (que tem seu próprio toque personalizado) no fatídico dia em que você vai morrer e nesse dia você ganha o título de "Terminante", o atendente te indica alguns eventos específicos para os terminantes e lamenta muito.
Então dentro das vinte quatro horas corridas você morre.
Rufus é um terminante que perdeu os pais meses atrás, ficou extremamente abalado e quando finalmente estava seguindo em frente, pimba, recebe a ligação.
Mas em muitas partes ele se mostra muito corajoso não só pela situação que ele está vivendo, não consigo nem conceber a ideia aterrorizante que é saber o dia em que se vai morrer, mas também em se mostrar vulnerável ao se abrir sobre o acidente que levou toda sua família.
A morte é feita para celebrarmos o tempo que temos em vida.
Então, em suma, eu estou bem tranquila com o fato de que um dia eu vou viver apenas em lembranças - ainda tenho medo de como isso vai acontecer - e de fato não acho que deveria ser um tabu falar sobre esse processo que é o natural da vida.
Falar sobre a morte não atrai a morte ela simplesmente anda ao nosso lado.
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